Eu não nasci para ser líder. Em vez disso, nasci para ser a eterna estudante, curiosa
sobre todas as coisas e disposta a explorar novos caminhos em busca de mais
conhecimento. Segui uma carreira científica sem dúvida, mas a sequência de
acontecimentos me levou a um caminho bastante diferente do usual, pelo menos aqui
no Brasil.
Fui pesquisadora acadêmica durante a maior parte da minha vida. Comecei como
estudante de graduação com minha primeira bolsa de estudos, avancei na pós-
graduação em Ciências Biomédicas para obter meu Mestrado e Doutorado trabalhando
no metabolismo do colesterol e segui em frente, em meados dos anos 80, para tentar a
sorte em um laboratório recentemente iniciado na emergente área de Imunogenética e
Imunologia de Transplantes. Vale destacar que eu, anteriormente nunca tinha
aprendido nada sobre Imunologia, mas o Prof. Jorge Kalil me acolheu e me deu uma
chance única na vida de me tornar uma pesquisadora produtiva. Ao longo dos anos
trabalhando no Laboratório de Imunologia de Transplantes, no Instituto do Coração,
adquiri responsabilidades como líder de equipe (Imunogenética), líder técnica (Biologia
Molecular) e até mesmo como gerente de compras e armazenamento de produtos
descartáveis de laboratório.
Em 2002, devido, em parte, à completa ausência de uma possível carreira acadêmica,
um problema comum em organizações brasileiras, deixei o Instituto do Coração para
me juntar à equipe que se propunha a introduzir o transplante de ilhotas pancreáticas.
Foi uma aventura científica de nove anos repleta de dificuldades que me proporcionou
conhecimentos valiosos sobre a conduta responsável e as boas práticas em pesquisa
clínica e translacional. Também comecei a conduzir estudos em uma área, na época
promissora, de pesquisa com células-tronco mesenquimais. Em 2008, com um beco
sem saída no horizonte, pois o ambicioso programa de transplante de ilhotas ia ser
interrompido e sabendo que meu contrato temporário como professora visitante não
poderia ser renovado de acordo com as regras vigentes, recebi um convite para me
mudar para outra instituição, desta vez, um hospital privado.
A pesquisa biomédica e clínica no Brasil é quase exclusivamente realizada em
universidades públicas. A falta de financiamento, infraestrutura precária e escassez de
oportunidades de emprego levam ao conhecido fenômeno da fuga de cérebros. Como
observado por Pillai et al., "para romper esse ciclo retroalimentado, a infraestrutura de
pesquisa científica em países de baixa e média renda precisam desenvolver-se para
além do ponto crítico no qual os cientistas tenham maiores incentivos profissionais para
permanecer em seus países de origem" ( https://doi.org/10.1186/s12909-018-1331-y ).
Esses são alguns dos fatos que levaram o Prof. Luiz Vicente Rizzo a desenvolver um
ambicioso plano de 10 anos que previa uma maneira inovadora de criar um ambiente
produtivo de pesquisa em um hospital bem estabelecido, altamente conceituado e
internacionalmente certificado (Hospital Israelita Albert Einstein, HIAE) localizado em
São Paulo. Este hospital, juntamente com a Medicina Diagnóstica, Responsabilidade
Social e Ensino e Pesquisa, constituem a Sociedade Beneficente Israelita Brasileira
Albert Einstein (SBIBAE), uma organização sem fins lucrativos com a missão de
oferecer excelência em cuidados de saúde e serviços sociais e, também, fomentar o
conhecimento em nome da comunidade judaica vivendo no Brasil, parte dela tendo
chegado durante ou logo após a Segunda Guerra Mundial
Primeiro, uma linha do tempo para ajudar a entender onde eu entro. O HIAE iniciou
suas atividades em 1976, mas o Centro de Pesquisa Experimental (CPE) foi
efetivamente criado no ano de 2002, e a atual estrutura do laboratório foi inaugurada
somente em 2005. De 2005 a 2008, com a ajuda de doações institucionais, o
laboratório começou a desenvolver projetos de pesquisa que abrangiam desde a
descoberta de genes e identificação de biomarcadores em diferentes doenças até
estudos funcionais com nanopartículas e exossomos. Em 2008, com a chegada de um
novo diretor (Prof. Rizzo), a questão passou a ser como estabelecer um ambiente
produtivo de pesquisa com fundos limitados, equipe reduzida e no curto prazo. Eu me
juntei às fileiras em janeiro de 2009.
Quando cheguei, responsável pela pesquisa experimental, o CPE consistia de um
laboratório multiusuário de 470 m2 conectado a escritórios de trabalho e estudo para a
equipe técnica, pesquisadores e estudantes, totalizando uma área de
aproximadamente 650 m2. O centro pertence ao Instituto Israelita de Ensino e
Pesquisa Albert Einstein (IIEP), inaugurado em 1998, e trabalha até hoje lado a lado
com os outros departamentos dedicados ao ensino e ao desenvolvimento científico: o
Centro de Pesquisa Clínica, que também atua como gestor da pesquisa clínica para
toda a SBIBAE, o Instituto do Cérebro voltado para neurociências e neuroimagem, o
Centro de Experimentação e Treinamento em Cirurgia (CETEC), bibliotecas, escritório
de pós-graduação e escritórios de trabalho, além do Escritório de Apoio ao
Pesquisador que atua para toda a SBIBAE.
Assim, deixei minha longa carreira na Universidade de São Paulo, pública, para me unir
a outros em uma tentativa de abrir um caminho inovador para alcançar a excelência em
pesquisa. Os capítulos seguintes descrevem decisões tomadas, tarefas grandes e
pequenas realizadas, destaques dos progressos alcançados e obstáculos imprevistos
encontrados na busca de estabelecer um ambiente de pesquisa biomédica em
expansão e frutífero, em um curto período, com espaço limitado e financiamento
escasso. Como poderão ver ao longo desse relato, na maioria dos casos o processo
envolveu outras áreas participando para desenvolver a pesquisa na instituição, e o
sucesso é, sem dúvida, devido aos esforços conjuntos de todas as áreas envolvidas
em pesquisa, uma dica valiosa a ser adotada por qualquer pessoa em posições de
liderança. Assim, é preciso destacar que a parceria com outras áreas em uma
instituição ajuda a impulsionar o sucesso e tem impacto direto na manutenção das
metas de excelência em pesquisa almejadas.
Gostou? Então volte na semana que vem para mais um capítulo!
Exercising leadership: A personal experience (2009-2020) -
Chapter 1. Background
I wasn´t born to be a leader. Instead, I was born to be the eternal student, to be curious of all things
and to try out new avenues in search of more knowledge. A science career, undoubtedly, but events
led to a quite different one from the usual track, at least here in Brazil.
I have been an academic researcher for most of my life. I began as an undergraduate with my first
fellowship, progressed through graduation in Biomedical Sciences to obtain my M.Sc. and Ph.D.
working on cholesterol metabolism, and went on to try my luck in a brand-new laboratory, in the mid-
eighties in the emerging area of Immunogenetics and Transplant Immunology. Of note, I had
previously never learned anything about Immunology, but Prof. Jorge Kalil was welcoming and gave
me a once in a lifetime chance to become a fruitful researcher. During the years working in the
Laboratory of Transplant Immunology, at the Heart Institute, I acquired responsibilities as team leader
(Immunogenetics), technical leader (Molecular Biology), and even as manager of purchase and
storage of lab consumables.
In 2002, due in part to the total absence of a possible tenure track, a common problem in Brazilian
organizations, I left the Heart Institute to join the team striving to forward pancreatic islet transplants.
That became a nine-year long scientific adventure fraught with difficulties that gave me precious
insights into responsible conduct and good practices in clinical and translational research. I also
started to conduct studies in the, at the time, promising area of mesenchymal stem cell research. In
2008, with a dead-end looming before me as the ambitious islet transplant program drew to a halt and
my temporary contract as visiting university professor not renewable by the current regulations, I
received an invitation to move to another institution, this time, a private hospital.
Biomedical and clinical research in Brazil is almost exclusively carried out in public universities.
Insufficient funding, fragile infrastructure, and lack of employment opportunities lead to the well-
known brain drain phenomenon. As noted by Pillai et al. “to break this self-propagating cycle,
scientific research infrastructures in Low- and Middle-Income Countries (LMIC) will need to develop to
a tipping point beyond which scientists have greater professional incentives to remain in their home
countries” ( https://doi.org/10.1186/s12909-018-1331-y ). These are some of the facts that drove Prof.
Luiz Vicente Rizzo to develop an ambitious 10-year plan that envisaged a novel way to create a
productive research environment in a well-established, highly esteemed, internationally certified
Hospital (Hospital Israelita Albert Einstein, HIAE) located in São Paulo, Brazil. This Hospital, together
with Diagnostic Medicine, Social Responsibility, and Education and Research constitute the Albert
Einstein Jewish-Brazilian Beneficent Society (SBIBAE), a non-for-profit organization with the mission
of offering excellence in health care and social works, and fostering knowledge in the name of the
Jewish community living in Brazil, in part arrived during or right after World War II
(https://www.einstein.br/en/about-einstein/the-sociedade-beneficente-israelita-brasileira-albert-
einstein/history).
First, a timeline to help understand where I come in. HIAE began its activities in 1976, but the
Experimental Research Center (CPE) was effectively born in the year of 2002 and the current
laboratory structure inaugurated only in 2005. From 2005 to 2008, with the help of institutional
endowments the laboratory started to develop research projects ranging from gene discovery and
identification of biomarkers in different diseases to functional studies with nanoparticles and
exosomes. In 2008, with the arrival of a new director (Prof. Rizzo), the issue became how to establish
a productive research environment with limited funds, small staff, and in a short timeframe. I joined
the ranks beginning 2009. When I arrived, newly in charge of experimental research, CPE consisted
of a 470 m2 wet lab core facility linked to work and study offices for technical staff, researchers, and
students, comprising a total area of approximately 650 m2. The center belongs to the Albert Einstein
Jewish Institute for Education and Research (IIEP) inaugurated in 1998, and works to this date side
by side with the other departments devoted to learning and developing science: the Clinical Research
Center acting also as a Site Management Office for all SBIBAE, the Brain Institute focused on
Neurosciences and Neuroimaging, the Animal Care Facility and Experimental Surgery Training
Center (CETEC), Libraries, Graduate Program and working offices, and the Researcher Support
Office working for all SBIBAE.
Thus, I left my long career in the public University of São Paulo to join forces in trying to pave an
innovative way to achieve excellence in research. The following chapters describe decisions made,
tasks big and small carried out, highlights of progress made, and unforeseen pitfalls encountered in
the quest of establishing an expanding and fruitful biomedical research environment in a short period
of time, with limited space and tight funding. As shown throughout, in most instances the process
included other areas, working in and for the development of research in the institution, and success is
undoubtedly due to the joint efforts by all areas involved in research, a precious tip to be embraced by
anyone in leadership positions. Thus, one must highlight that partnering with other areas in an
institution helps drive success and impacts directly on the maintenance of the goals when striving for
research excellence.
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